A Súplica: Instruções sobre “Chamando o Lama de longe” de Jamgon Kongtrul Lodro Thaye, o Grande – parte 1

Sua Eminência, o III Jamgon Kongtrul Rinpoche – Karma Lodro Chokyi Senge

Ensinamento dado pelo III Jamgon Kongtrul Rinpoche, Karma Lodro Chokyi Senge

Introdução

Eu gostaria de pedir a todos que dessem uma oportunidade à fé e à confiança no Budadharma. Enquanto uma pessoa escuta os ensinamentos do Senhor Buda, ela tem esperança de entendê-los. Se essa pessoa não os entende, então as bênçãos dos ensinamentos não podem entrar em sua mente. É muito importante ter uma mente clara – conceito que os ocidentais têm dificuldade para entender quando estão estudando a tradição tibetana do Budismo. Na realidade, se uma pessoa tem fé pura e devoção pelo professor, é possível receber as bênçãos dos ensinamentos através da mera presença em um ambiente onde os ensinamentos do Senhor Buda estão sendo transmitidos. Eu encarecidamente peço a todos que gerem a atitude iluminada do despertar antes de receberem as instruções que levam o título de “Chamando o Lama de longe”, escritas por Jamgon Kongtrul Lodro Thaye, o Grande.

Os participantes desse curso são seguidores do Mantrayana Secreto, também chamado de Vajrayana. A palavra “Secreto” refere-se ao fato de que o sentido das instruções só pode ser compreendido por meio da capacidade de sabedoria, compaixão e devoção por parte do praticante. O que caracteriza o Vajrayana? Por meio da prática das instruções do Vajrayana, um praticante altamente qualificado pode atingir a budeidade em um instante. Um praticante avançado pode atingir a onisciência nessa vida ainda. Um praticante do Vajrayana com menos propensões pode atingir a budeidade durante o bardo da morte, quando a mente se funde e se mistura com a manifestação simultânea da vacuidade e da aparência – que é representada por Dorje Chang ou Vajradhara.

O Vajrayana é muito profundo; suas qualidades são excepcionais. Para praticar os métodos e os meios ensinados e atingir a fruição é preciso que o praticante aprecie as Três Raízes, que são: os Lamas, os Yidams e os Protetores. O Lama é a Raiz mais significante para o avanço no caminho espiritual.

Ao tornar-se discípulo de um Lama, esse discípulo não deve vê-lo (a) como uma pessoa comum ou como um amigo espiritual. O Lama de alguém personifica a essência de todos os Budas dos três tempos. Ele é a encarnação de todos os Budas e das cinco sabedorias. Se um discípulo convive com um Lama-Raiz corretamente, as bênçãos da mente do Lama poderão penetrar no seu coração e tornar esse discípulo capaz de alcançar diretamente a realização Mahamudra. O Vajrayana é um caminho muito direto para atingir o Mahamudra, que, por sua vez, é o reconhecimento do estado natural e verdadeiro da mente.

Devoção, veneração, fé pura e convicção são os fatores mais decisivos para um praticante quando este embarca na viagem espiritual do Vajrayana. Um discípulo precisa desenvolver a devoção, assim como a gratidão, e ter fé pura através da convicção que sente a respeito do Lama-Raiz e de todos os Lamas de transmissão da linhagem. Quando um discípulo do Vajrayana pratica o caminho, o seu progresso dependerá da estabilidade e convicção que ele ou ela gerou e desenvolveu. Prática convicta e conquista da fruição dependem da devoção e veneração do discípulo por seu ou sua Lama-Raiz.

Alguns discípulos têm uma fé natural no seu Lama; outros têm dificuldades com isso. Dessa forma, é necessário desenvolver gradativamente a devoção sincera e a confiança. Um iniciante precisa checar sua atitude e olhar para a sua própria mente; com isso, ele será capaz de nutrir uma devoção pura pela manifestação externa do Lama – o que se torna natural e espontâneo durante a prática de estágios avançados do caminho espiritual. Um discípulo primeiro contempla as qualidades do seu Lama para, gradualmente, estabelecer uma devoção inabalável, que passa então a se chamar “não-artificial”. Veneração e dedicação não-artificiais e espontâneas contribuem para o progresso. Mais bênçãos, então, são transmitidas pelo Lama-Raiz até que o discípulo consiga reconhecer a natureza verdadeira da sua própria mente e viver a fé pura. Esses são os três estágios do estabelecimento de um relacionamento com um Lama: devoção espontânea que nasce a partir da inspeção; veneração espontânea e natural; e o reconhecimento da verdadeira natureza da mente – que é a fé pura.

Existem diferentes tipos de Lamas: o Lama externo, o Lama interno e o Lama último. O Lama externo é o Lama que as pessoas pensam que é separado delas mesmas. Uma mente confusa compreende dualistamente ao distinguir a compreensão de si mesmo em oposição à compreensão dos objetos. Os indivíduos procuram um guia que os conduza ao longo do caminho da maturidade espiritual – razão pela qual os estudantes precisam de um Lama externo, um amigo espiritual a ser respeitado. Esse amigo espiritual pode ser qualquer um em quem o discípulo confie. Tendo escolhido um Lama como amigo espiritual, o estudante pede instruções, segue os exemplos de vida do Lama e se esforça para alcançar os mesmos resultados do seu Guru. Quando o discípulo reconhece a verdadeira natureza de sua própria mente, então ele percebe que o Lama último é, na verdade, a própria e não-iludida mente. Um iniciante primeiro anseia experimentar e reconhecer sua mente unida com a mente do Lama e, depois, passa a cultivar esse anseio todos os dias, o dia todo. E a partir daí, o estudante pode experimentar e reconhecer o Lama interno. Essa é uma característica marcante do Mantrayana.

Eu gostaria de mencionar alguns problemas que observei sobre a questão do Lama externo e do Lama interno. Alguns praticantes pensam que podem praticar por conta própria depois de receber umas poucas instruções de seu Lama. Acham que, de posse dessas poucas instruções, não precisarão mais de orientação e assistência. Essa atitude revela falta de respeito e o praticante que a adota frequentemente perde o rumo. Outros praticantes acreditam que, uma vez que o seu Lama tenha morrido, a conexão com o falecido Lama estará terminada. Tais ideias estão erradas e demonstram que o relacionamento que o discípulo tem com o seu Lama está incorreto. Também fico muito entristecido por já ter testemunhado praticantes completarem seus retiros de três anos sob a orientação de instrutores de meditação qualificados e, depois, mostrarem total falta de respeito por tais instrutores. Se um instrutor não se provou incapaz e sem valor, então, a falta de respeito em relação a ele é uma atitude errada. Tenho visto pessoas terminarem seus retiros sem mostrar qualquer respeito pelos seus instrutores. Essas pessoas acham que são tão boas quanto seus instrutores porque ambos terminaram o retiro juntos – o que é uma evidência de que o praticante não tem qualquer entendimento. Na verdade, quanto maior o entendimento do praticante, maior a sua devoção.

Eu quero que todos saibam que não é apropriado separar o Lama externo do Lama interno. Pelo contrário: o discípulo precisa ver o seu (ou sua) Lama como a personificação dos dois Lamas. Um praticante pode entender o seu Lama interno – que encarna a verdade da realização – mesmo quando recebeu todos os ensinamentos do seu Lama externo – aquele com quem o discípulo se encontra para estudar. As pessoas já estão tão acostumadas a encontrar diversos professores em diversas escolas que, quando se encontram com o seu Lama-Raiz, tratam-no como se fosse mais um desses professores. Na escola, as pessoas trocam de professor conforme mudam de classe e curso. A relação entre um Guru e um discípulo é diferente da relação que as pessoas têm com os professores da escola.

Um certo número de pessoas já me pediu para que eu passasse a ser seu Lama-Raiz depois da morte de seus Lamas. Essa não é uma boa conduta e é muito típica dos ocidentais, que, de uma maneira geral, são inseguros sobre a reencarnação. Muitos ocidentais pensam que o seu Lama, ao morrer, vai embora para sempre e que a única coisa a ser feita nesse caso é providenciar um novo Lama. Quero que todos saibam que nosso Lama-Raiz é o nosso Guru – para sempre. Não há razão para mudar de comportamento em relação ao nosso Lama depois que este morre, já que a relação entre o discípulo e o Guru é imutável e nunca termina. Também há aquelas pessoas que mudam de um Lama para outro, que lidam com isso como se estivessem fazendo compras. Elas pensam que podem trocar de Lama como trocam de roupa e, assim, receber novas instruções, novas inspirações e por aí vai. É bom receber ensinamentos de vários professores, mas um discípulo não troca de Guru. Ao trocar de Guru, o praticante está dando mostras de que sua devoção e fé no seu Lama-Raiz são muito fracas.

Também me deixa muito triste ver que há praticantes que, ao deixar o retiro, mostram respeito somente pelos Lamas que se sentam nos tronos mais altos, que vestem mantos bordados e de seda, que têm um título; sem mostrar respeito pelos mestres do retiro, que lhes transmitiram todos os ensinamentos. Isso é muito ruim. Quer o instrutor seja famoso ou não, ele ou ela mostrou ao praticante a natureza de sua mente durante o retiro. Dessa forma, o instrutor é, verdadeiramente, sem dúvida alguma, o Lama-Raiz desse praticante. É muito importante dar valor a esse fato durante o retiro e após também. Eu tenho visto casos de desrespeito com tanta frequência, que achei oportuno dar ênfase a esse assunto. Vejo praticantes desrespeitando seus Gurus após saírem do retiro e tratando-os como pessoas ordinárias. Não é um mandamento tibetano que alguém deva respeitar seu mestre de retiro. Ao contrário: o respeito por esse mestre é Dharma, uma verdade universal e espiritual. Então, é muito importante que todo mundo aprenda como interagir com um Guru e como manter um correto e puro relacionamento com ele.

A Finalidade e a Homenagem

Enquanto um discípulo recebe instruções sobre o Budadharma ou ora pelo seu Lama, é muito importante que ele entenda que a única coisa que o samsara traz é o sofrimento e que é justamente por isso que é preciso renunciar a tudo que produz sofrimento e dor. Não há qualquer perspectiva de benefício no samsara.

Ao recitar uma prece ao seu Lama, o discípulo precisa entender claramente que o seu Lama é a corporificação todos os Budas dos três tempos e das dez direções. Ao gerar pura devoção pelo seu Lama antes de começar a recitação, as preces serão sinceras e, então, será possível receber todas a bênçãos e a inspiração desse Lama. Enquanto ora, é vital que a mente do discípulo se mantenha livre de medos e esperanças mundanos. A devoção superficial durante as práticas litúrgicas deixa a mente do discípulo perturbada e afastada e isso impedirá que as bênçãos do Lama entrem na mente do devoto. A mente do discípulo precisa ficar elevada como ficam as asas de um pássaro antes de levantar voo para que o devoto experimente os benefícios que a genuína e espontânea recitação de um texto tão precioso quanto o que eu ensinarei aqui é capaz de suscitar.

O título da súplica sobre a qual quero falar é “Chamando o Lama de Longe”. É uma prece pela qual chamamos nosso Lama à distância. Ele pode estar longe fisicamente, ele pode até ter morrido e aí o chamamos. Mas a prece não é apenas para essas ocasiões. Se um discípulo está confiante e certo de que o seu Lama é a corporificação de todos os Budas, então esse discípulo com visão pura não percebe a distância física como um obstáculo e, dessa forma, é capaz de recitar a súplica e receber a inspiração derramada pelo Lama o tempo todo. Para um estudante dedicado, que tem convicção de que o seu Lama é a corporificação de todos os Budas, a distância é irrelevante. Se um devoto ora regularmente, este recebe uma chuva de bênçãos ininterrupta. E esse é o significado do começo da súplica, que diz:

“Namo Guru.

Lama, pense em nós.

Bondoso Lama-Raiz, pense em nós.”

A renúncia é decisiva quando alguém está recebendo as bênçãos de seu Lama; a devoção e a dedicação são elementos-chave na conquista da convicção de que o nosso Lama está unido, de forma inseparável, com todos os Budas. Renúncia e devoção devem vir do coração e não têm nada a ver com belas palavras ditas da boca para fora. Devoção genuína nasce do centro mais recôndito de um ser, da essência dos ossos desse ser. Ter total convicção de que não existe melhor Lama que o Buda e de que o nosso Lama é o Buda significa ter alcançado a visão sagrada.

Nosso Lama-Raiz é o Buda – um fato que o discípulo precisa reconhecer e apreciar completamente. Alguns seguidores não têm um Guru-Raiz. Há alguns aqui que erroneamente acreditam que essa súplica não se aplica a eles – isso não é verdade. Somos todos seguidores de Karma Kamtsang, a linhagem da prática. O detentor dessa linhagem é o Gyalwa Karmapa. Então, se você não tem um Lama-Raiz, ore para a Sua Santidade, o Karmapa. Na verdade, mesmo que você tenha um Lama-Raiz, você pode vê-lo como inseparavelmente unido ao Karmapa e então, você ora para o Karmapa. Você pode, sem dúvida alguma, enxergar o Karmapa como seu Guru-Raiz enquanto você ora para o seu Lama. Se você fizer isso, é importante enxergar o Karmapa como Vajradhara, o Buda primordial e a perfeita fonte da Transmissão Oral da Linhagem da Tradição Kagyu. Quando um discípulo tem convicção, ele então recita “A Súplica” escrita por Jamgon Kongtul Lodro Thaye e ora:

“Essência dos Budas dos três tempos,

Fonte do Dharma genuíno na escritura e na prática,

 Mestre da nobre assembleia da Sangha,

Lama-Raiz, pense em nós. ”

Nosso Lama é a essência de todos os Budas dos três tempos (passado, presente e futuro). Quando se fala sobre Buda nos ensinamentos, nós geralmente pensamos no Buda Shakyamuni com suas trinta e duas marcas maiores e oitenta marcas menores de iluminação – o que não é o caso, aqui, no contexto dessa prece. “A Súplica” refere-se à essência de Buda; e a essência de Buda é o Dharmakaya, “a realidade última”, que só a mente de um Buda consegue perceber.

A prece continua e ensina que o nosso Lama é a fonte do Dharma sagrado, do puro e autêntico Dharma da tradição escrita e da tradição de quem atingiu a realização; estes [os lamas] nos deixaram, com imensa generosidade e bondade, uma Linhagem ininterrupta. Todos os ensinamentos do Buda podem ser resumidos nessas duas Linhagens de Transmissão, que, por sua vez, foram vividas pelo nosso Lama-Raiz. Devido à sabedoria do nosso Lama, ele é capaz de ensinar o Dharma sagrado a qualquer discípulo. Desse modo, os ensinamentos que o nosso Lama transmite e os ensinamentos do Senhor Buda não são diferentes, razão pela qual consideramos que o nosso Lama é a fonte do Dharma sagrado. E mais: o nosso Lama é o mestre da Sangha, a nobre assembleia de seguidores que mantêm e transmitem os ensinamentos para nós. O Senhor da Sangha é o Buda Shakyamuni, que é inseparavelmente ligado ao nosso Lama. Por isso, nosso Lama é o Senhor e o mestre dos nobres membros da preciosa Sangha. O primeiro verso de “A Súplica” aborda as Três Joias corporificadas no nosso Lama – a unificação de Buda, Dharma e Sangha. Qual é o significado disso?

Um Buda é um ser realizado que identifica que a realidade condicionada e a realidade última são uma coisa só, formam uma totalidade. Nosso Lama atingiu a realização última, que é a onisciência. Ele percebe a natureza relativa e a natureza última dos seres – isso porque ele alcançou a sabedoria primordial. Ele ou ela entendeu que não há divisões entre o vazio, o amor, a compaixão, o samsara e o nirvana. A essência da mente do nosso Lama é a sabedoria primordial – por exemplo: ele identifica o vazio e simultaneamente manifesta bondade amorosa e compaixão. Ele praticou, colocou seus meios hábeis a serviço da fruição e, assim, alcançou um grande êxtase.

Os ensinamentos sobre o Dharma que nosso Lama transmite são a expressão da sua compaixão, que ele desenvolveu praticando os eficientes caminhos do Buda em direção à onisciência. Em resumo, a sabedoria é a essência da mente do nosso Lama; suas instruções são uma expressão da sua compaixão e também a manifestação dos seus meios hábeis.

Todos os praticantes experientes e avançados formam a Sangha, conjunto dos indivíduos que receberam as bênçãos da transmissão e que compreenderam a natureza da fonte de todos os ensinamentos. Nosso Lama é a fonte de todas as bênçãos e ensinamentos e, portanto, é o mestre da Sangha.

“Grande tesouro de bênçãos e compaixão,

 Fonte dos dois siddhis,

Atividade búdica que concede tudo que é desejado,

Lama-Raiz, pense em nós.

 

Lama Amitabha, pense em nós.

Da vastidão do Darmakaya, livre de conceituações, olhe por nós,

Nós vagamos no samsara através da força do karma negativo;

Leve-nos a renascer na sua terra pura da beatitude.

 

Lama Chenrezik, pense em nós.

Da vastidão do Sambhogakaya, pleno de luz, olhe por nós.

Pacifique completamente o sofrimento dos seis tipos de seres

E transforme totalmente os três reinos do samsara.

 

Lama Padmasambhava, pense em nós.

Do luminoso lótus de Nga Yab Ling, olhe por nós.

Nesses tempos de trevas, proteja prontamente com sua compaixão

Os discípulos tibetanos e todos os destituídos e sem refúgio.

 

Lama Yeshe Tsogyal, pense em nós.

Da cidade de grande bem-aventurança das Dakinis, olhe por nós.

Leve-nos, nós que cometemos ações negativas,

Através oceano do samsara até a grande cidade da libertação.

 

Lamas das linhagens de transmissão oral e das linhagens das termas, pensem em nós.

Da vastidão da sabedoria primordial, da união (entre aparência e vacuidade), olhem por nós.

Ajudem-nos a sair da cela escura de nossas mentes confusas

E façam o sol da realização nascer.

 

Onisciente Drime Ozer, pense em nós.

Da vastidão das cinco luzes espontâneas, olhe por nós.

Ajude-nos a aperfeiçoar nossas mentes, primordialmente puras,

E a completar os quatro estágios da ati yoga.

 

Incomparável Atisha e seu filho do coração,

De Tushita, em meio a centenas de divindades, olhem por nós.

Despertem, no fluxo de nossas mentes,

A bodhichitta, essência da vacuidade e da compaixão.

 

Supremos siddhas, Marpa, Milarepa e Gampopa, pensem em nós.

Do espaço da grande bem-aventurança vajra, olhem por nós.

Façam com que sejamos capazes de atingir o siddhi supremo do Mahamudra – êxtase e  vacuidade inseparáveis;

Despertem o dharmakaya no âmago dos nossos corações.

 

Senhor do mundo, Karmapa, pense em nós.

Do espaço onde todos os seres, em número tão vasto quanto o céu, são treinados, olhe por nós.

Faça com que possamos ver que todos os fenômenos são como uma ilusão, sem existência verdadeira.

Ajude-nos a perceber a aparência e a mente surgindo como os três kayas.

Nós vimos que o nosso Lama é a indivisibilidade das Três Joias – Buda, Dharma e Sangha.  Os versos que acabamos de ver ensinam que nosso Lama é as Três Raízes – o Lama, os Yidams e os Protetores. Nós ouvimos que nosso Lama é a raiz de todas as bênçãos; os Yidams são a raiz de todos os siddhis ou êxitos; e os protetores do Dharma, os Dakas e as Dakinis são a raiz de todas as atividades.

Sabemos que o nosso Lama é a raiz de todas as bênçãos porque é dele que recebemos todos os ensinamentos da linhagem da transmissão; dessa forma, ele é a primeira das Três Raízes. Nosso Lama é também a fonte dos êxitos tanto ordinários quanto supremos. O supremo êxito é a Budeidade, o estado da perfeição. Os êxitos ordinários, tais como a felicidade, bem-estar, habilidade de pacificar as perturbações e tantos outros similares a esses são realizações atingidas durante o caminho da iluminação. Muitos êxitos ordinários são vividos enquanto praticamos os métodos do caminho. Os Yidams são a fonte de todos os êxitos e se manifestam através da mente compassiva do nosso Lama. Portanto, o nosso Lama é fonte dos êxitos da sabedoria e dos meios hábeis, uma vez que sua mente manifesta os Yidams e as qualidades destes.

A fonte de todas as atividades são os Dakas e as Dakinis – as forças de energia dentro de cada um dos seres vivos. Tais forças se manifestam em quatro tipos de atividades: pacíficas, enriquecedoras, magnetizadoras e iradas. Os Protetores também são uma expressão da mente de nosso Lama. Não existe um Daka ou Dakini separado do nosso Lama e, consequentemente, nosso Lama é a fonte de todas as atividades que nós buscamos e desejamos alcançar. Em resumo, o nosso Lama é a pura encarnação de todos os aspectos da iluminação. Em qualquer situação, oramos a ele e pedimos-lhe que, generosamente, olhe para nós com compaixão.

A prece continua com a súplica a todos os Lamas das oito maiores Linhagens de ensinamentos. É aconselhável estudar a história do Budismo no Tibete e saber quem são os Lamas das Linhagens, pois todos eles são aspectos do nosso Lama-Raiz. Não é necessário memorizar o nome da cada um desses Lamas; o mais importante é que nós façamos nossas preces ao nosso Lama com fervor, fé e devoção. Como resultado, conseguiremos receber a inspiração e as bênçãos do nosso Lama.

Em síntese, ao recitar a prece “Chamando o Lama de Longe”, é essencial ter confiança e convicção no fato de que o nosso Lama personifica todos os Budas dos três tempos. Fé e confiança capacitam um discípulo a compreender o valor de todos os Lamas das Linhagens e suas qualidades; desse modo, recitamos a primeira seção da prece com fé profunda e devoção sincera.

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Nota da tradução para o inglês: A tradução do Texto Raiz foi realizada por Dzogchen Ponlop Rinpoche e Michele Martin e baseou-se em uma versão realizada pelo Comitê de Tradução Nalanda, em “Journey without Goal”, de Chogyam Trungpa (Shambhala, 1985); publicada no “His Eminence Jamgon Kongtrul Rinpoche. In Memory”, Jamgon Kongtrul Labrang, Rumtek, Sikkim, 1992, páginas 42-73. As instruções apresentadas por Jamgon Rinpoche na França, em 1990, foram transcritas para os arquivos do Monastério Pullahari, no Nepal, e organizadas por Gaby Hollmann, responsável por quaisquer erros.  

Todos os conteúdos © Thar Lam

Original em inglês: ‘The Supplication: Instructions on Calling the Lama from Afar by Jamgon Kongtrul Lodro Thaye the Great’. Thar Lam, The Path of Liberation, The International Journal of Palpung. Dezembro, 2007. p. 15 – p.37

Traduzido para o português por KTC – Cláudia Marcanth.

Revisado e editado por Cláudia Carréra.
KTC, maio de 2015